sábado, 28 de abril de 2012

LONGEVIDADE X IMORTALIDADE



LONGEVIDADE  x  IMORTALIDADE

Mario Gentil Costa

L
ongevidade é meta prioritária de todos os humanos. Ninguém quer morrer cedo, e, embora o paradoxo, ninguém quer ser velho ou aceita sem protestos os sinais do envelhecimento. A aparência jovem - ou seus simulacros - comanda as preocupações e determina ou justifica qualquer sacrifício. Daí tanto campo para as técnicas cirúrgicas de rejuvenescimento, tais como os liftings, os botoxes, as lipoaspirações, os silicones, as plastias em geral. Mesmo que isso envolva riscos e já tenha resultado em óbitos, vale tudo na luta inglória contra os inexoráveis estragos do tempo. São raros os testemunhos de gente famosa que se recusa a essas práticas, como o de um certo ator, que, diante da cautelosa sugestão de uma fã ou de uma repórter, teria declarado ser contra tais artifícios por considerar cada uma de suas rugas - que de fato não são poucas - uma medalha adquirida em sua guerra pela sobrevivência. Admirável!

A ânsia pela vida longa cresce diante da constatação de que algumas espécies, tanto na fauna quanto na flora, são capazes de viver séculos. Afinal, por que só a gente - que se tem na orgulhosa conta de ser a obra favorita da "criação" - tem de pagar o preço de uma morte comparativamente precoce, se até um estúpido molusco pode viver 400 anos, como foi divulgado recentemente. Para se ter idéia do quanto essa concha, chamada Quahog, já viveu, basta lembrar que é contemporânea de Shakespeare. Isso, por acaso, é justo? Pode até não ser, mas parece ter explicação científica. Segundo as conclusões do pesquisador Leonard Hayflick, o envelhecimento decorre do desgaste no metabolismo celular. Um ser vivo permanece saudável enquanto suas células conservam a capacidade de se reproduzir à perfeição. E esse fac-símile decai com a seqüência da repetição. Seria, em analogia exagerada e grosseira, como se sucessivas cópias-carbono servissem de matriz para o similar subseqüente; as imperfeições serão crescentes e inevitáveis. De resto, o número de vezes que uma célula pode replicar-se é programado por seus genes.

Além desse fator genético, a duração de cada ser depende da intensidade com que ele consome suas reservas de energia, ou seja, quanto mais intenso esse metabolismo, mais curta será sua vida. Um exemplo ilustrativo é o beija-flor, que, para sustentar-se parado no ar, bate as asas noventa vezes por segundo e, para isso, consome uma média de 6.000 calorias diárias. Pois bem. O preço que ele paga pelo privilégio dessa façanha de beleza plástica incomparável é viver a média de dois anos, ao passo que um canário, que se contenta em cantar, vive vinte, e um papagaio, que se dedica a repetir gracinhas e palavrões, pode chegar aos oitenta. Já a baleia, que tem energia calórica de sobra, chega facilmente aos 100 anos. Mas a regalia maior - ou mais injusta - coube a uma tartaruga chamada "Harriet", levada por Charles Darwin das Ilhas Galápagos para a Inglaterra, e que faleceu no ano passado aos 175 anos.

Tudo isso aponta para o aparente erro estratégico que os humanos cometem ao priorizar o rendimento máximo nos esportes competitivos. Ficará a cargo do futuro, provar que as atuais gerações de gloriosos medalhistas olímpicos, maratonistas e similares viverão menos. Tudo faz crer que a atividade física, praticada moderadamente e sem objetivos de bater sempre os recordes anteriores - como se o ser humano não conhecesse limites - é o segredo da longevidade sadia. As reações químicas intracelulares, através das quais o organismo humano sintetiza energias, também produzem os chamados radicais-livres que levam à oxidação celular e, em conseqüência, ao envelhecimento do corpo.

Existe um outro aspecto pouco cogitado, por remeter a indagações de ordem mais filosófica que biológica, como se, por detrás de tudo, prevalecesse um determinismo ontológico de ordem cósmica: "No estágio atual da evolução, o ser vivo, cumprindo inconscientemente as leis imutáveis do Ciclo de Krebs - nascer, crescer, reproduzir-se e morrer - preserva-se saudável até o período em que se reproduz e assegura a permanência de sua espécie. Depois, disso, por mais que lute e resista, ele, como indivíduo, entra num lento processo de falência orgânica até o momento de ceder espaço ao seu sucessor. Assim é a vida, por mais que as religiões e seus arautos nos acenem com perspectivas de sobrevivência eterna. Esta é minha honesta maneira de ver. E vale para todos, inclusive para os vegetais.

Por fim, foi encontrada no Brasil uma árvore, o Jequitibá-Rosa, que já completou 3000 anos. Quando Cristo teria pisado o planeta, ela já contava 1000. Mas como não existe imortalidade, ela também morrerá...

OBS: 

O autor do texto Mario Gentil Costa, reside em Florianópolis, SC, é médico otorrinolaringologista, com CRM: SC339(ativo)

 


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